quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Quanto Vale ou É Por Quilo?

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Quanto Vale ou É Por Quilo? (2005)

IMDb



Nunca é tarde para descobrir as preciosidade do nosso cinema. Não conhecia esse "Quanto Vale ou É Por Quilo?", filme de Sérgio Bianchi, de 2005. Assisti-o e fiquei chocada, sem chão.

O longa utiliza-se da ironia constante par fazer uma crítica ao Brasil, desde a época do colonialismo até os dias atuais. Sérgio Bianchi não poupa alfinetadas a ninguém, seja qual for a sua classe social, apresentando questões muito pertinentes sobre a desigualdade social, os direitos individuais e o capitalismo cada vez mais crescente, além da hipocrisia que domina a nossa sociedade.

Como em seu outro longa, "Cronicamente Inviável" (de 2000), Bianchi apresenta-nos uma realidade chocante, onde é impossível encará-la sem um desconforto ou constrangimento, e mostra que, mesmo na atualidade, nosso passado escravagista continua existindo.

A montagem paralela entre uma história que se passa na atualidade (e que é uma livre adaptação do conto "Pai contra Mãe", de Machado de Assis) e micro-histórias que refletem o passado, dão conta de mostrar que, apesar de separadas por séculos, a realidade não é de todo diferente, e que a nossa história como país influi, e muito, em quem somos hoje em dia como nação.

Além disso, o diretor ainda lança um olhar ácido sobre aquilo que muitos vêem como a solução para a desigualdade social do país - a criação desenfreadas de ONGs, e que, muitas vezes, apenas funcionam como qualquer outra empresa, objrtivando o lucro, Ou, sendo ainda pior, pois utilizam-se da miséria alheia como desculpa para instaurar corrupção e ganhar rios de dinheiro.

Outro ponto contundente do longa é a violência cada vez maior no país. Em um momento do longa, o presidiário vivido por Lázaro Ramos afirma "esse é o nosso navio negreiro", traçando uma analogia entre o sistema carcerário e o sistema de escravidão do Brasil. É como se a violência já estivesse institucionalizada, já fizesse parte do nosso sistema político.

E é essa violência enraizada, presente em todas as classes socio-econômicas, que vem mascarada numa sociedade de consumo capitalista. "O que vale é ter liberdade para consumir, essa é a verdadeira funcionalidade da democracia", profere o personagem de Lázaro Ramos em outro momento. Um realidade que ninguém quer ver, mas que ninguém pode negar.

Bianchi oferece um final duplo ao espectador. Duas possibilidades. Como que dizendo: vejam, as chances em melhorar estão aí, na nossa frente, é só nos mobilizarmos para fazermos alguma coisa. Ou então sucumbirmos de vez a um sistema já consolidado culturalmente em nossa sociedade. Afinal de contas, não há como negar que o desrespeito ao outro não é apenas circunstancial em nossa cultura, é um traço cultural.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski 



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