sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Melancolia

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Melancolia (Melancholia, 2011)

Estreia oficial: 26 de maio de 2011
Estreia no Brasil: 5 de agosto de 2011

IMDb



"Melancolia" tem início com um prólogo (como todos os filmes de Lars von Trier, é separado em capítulos) todo em câmera lenta, da mesma forma que seu longa anterior, "Anticristo" (2009), e que já anuncia o triste fim do planeta Terra. Além de mostrar os momentos finais dos personagens que veremos na sequência, essa belíssima sequência inicial também retrata cenas de conflitos internos destes personagens. Mantendo sua câmera parada e uma composição de quadro cuidadosa e irretocável, cada plano surge como uma pintura com leves movimentos.

Passado o prólogo, "Melancolia" divide-se em duas partes, cada uma centrada em uma das irmãs, Justine (Kirsten Dunst) e Claire (Charlotte Gainsbourg). Na primeira, acompanhamos a recepção de casamento de Justine, que logo mostra-se uma reunião de conflitos familares não resolvidos. A segunda metade trata de Claire e da aproximação do planeta Melancolia em sua rota para chocar-se com o nosso planeta.

Utilizando uma câmera na mão inquieta para retratar a festa do casamento de Justine, Lars von Trier consegue transmitir a tensão que gira em torno daquela família, ao mesmo tempo em que é extremamente bem sucedido ao mostrar a personalidade de seus integrantes. Se o pai de Justine e Claire, Dexter (John Hurt), chama todas as mulhers de Betty, numa clara alusão ao seu desrespeito ao sexo feminino, como se todas as mulheres fossem iguais; Gaby (Charlotte Rampling), mãe das protagonistas, mostra um ressentimento enorme em relação ao casamento e ao futuro de Justine, que anuncia estar fadado ao insucesso, o que é extremamente compreensível frente ao ex-marido que tem. E os experientes atores são hábeis em compor seus personagens, com olhares e gestos que denotam suas intenções.

Mas é mesmo Kirsten Dunst, no melhor papel da sua carreira, quem se destaca. Inicialmente Justine mostra-se uma pessoa feliz, sempre ostentando um sorriso no rosto. Porém, aos poucos, vamos descobrindo que sua aparente felicidade é apenas uma falsa fachada para conflitos internos e uma intensa depressão.

Já Claire (Gainsbourg, sempre excelente), embora deixe transparecer uma estabilidade emocional que contrapõe-se à irmã, na realidade esconde inseguranças e ansiedades. Sempre com um rosto sério, que jamais deixa transparecer se é feliz, Claire utiliza a família para encobrir seus medos e inseguranças.

Porém, quanto mais Melancolia aproxima-se da Terra, mais a dinâmica entre as duas irmãs parece mudar. Se Justine antes era tomada por uma depressão profunda; frente à morte iminente, parece assumir calma e serenidade, como se a sua vida, sofrida e pessimista, finalmente fizesse sentido. Já Claire, com a certeza da tragédia, vê seu 'castelo' ruir, e suas incertezas tomarem conta do que resta da sua vida. E nesse momento, Lars von Trier volta a adotar uma câmera mais tranquila e estática, refletindo a paz interior que toma conta da protagonista Justine.

Da mesma forma que seus outros filmes, von Trier recheia "Melancolia" com simbolismos, alguns mais óbvios como a constante sensação de imobilização de Justine que se resume em um belíssimo plano do prólogo onde raízes negras prendem-se às pernas e braços da personagem enquanto esta caminha; ou seu próprio cavalo que nega-se a transpor uma simples ponte, numa clara alusão à dificuldade que a moça tem de seguir à diante com sua vida; ou mesmo o nome óbvio do planeta em rota de colisão com a Terra.

Porém, mesmo sem perceber os simbolismos de Lars von Trier (e claro que só citei os mais evidentes - tenho certeza que quando assistir novamente ao longa, mais correlações surgirão), o filme já seria um excelente estudo de personagens e uma obra eficiente em mostrar a depressão de Justine e o quão isto afeta a todos ao seu redor.

Contando com um plano final arrebatador, chega a ser curioso que dois filmes lançados na mesma época abordem, cada um da sua maneira, a mesma questão cerne: independente do fim que teremos ou da maneira que vivemos a nossa vida, o que temos de mais valioso é o relacionamento e o amor por aqueles que nos cercam. E, se em "
A Árvore da Vida" a vida era tratada com otimismo, Lars von Trier a vê com certo pessimismo e de forma imprevisível (e o buraco 19 no campo de golfe de John, muito bem interpretado por Kiefer Sutherland, é a prova disso).

Fica a dica!


por Melissa Lipinski 



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