terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Se Meu Apartamento Falasse

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Se Meu Apartamento Falasse (The Apartment, 1960)

Estreia oficial: 15 de junho de 1960
IMDb



Billy Wilder foi um cineasta único. Nascido no antigo Império Austro-Húngaro (hoje sua cidade natal faz parte da Polônia), migrou para os Estados Unidos em 1933, quando Hitler ascendeu ao poder (seus pais eram judeus), e ingressou em Hollywood sob o 'apadrinhamento' de ninguém menos que (seu conterrâneo) Peter Lorre (o famoso "vampiro" de Düsseldorf de "M", de Fritz Lang - 1931).

Mas Wilder já trabalhava como roteirista desde 1929. Na direção, estreou codirigindo "Semente do Mal" de 1934, e teve seu debut solo em 1942, com "A Incrível Suzana". E a partir daí, 'nos deu' filmes como "Pacto de Sangue" (1944), "Farrapo Humano" (1945), "A Montanha dos Sete Abutres" (1951), "Inferno Nº 17" (1953), "Sabrina" (1954), "O Pecado Mora ao Lado" (1955), "Testemunha de Acusação" (1957) e "Uma Loura Por um Milhão" (1966), além, é claro, dos excepcionais clássicos, "Crepúsculo dos Deuses" (1950) e "Quanto Mais Quente Melhor" (1959).

Como se pode ver, Wilder conseguiu transitar entre diversos gêneros cinematográficos sem perder o alto padrão de seus filmes, e sempre contando com diálogos rápidos e afiadíssimos (uma de suas marcas registradas). E, embora muitos de seus filmes pendam para a comédia, ainda assim trazem uma visão crítica, amarga e bastante irônica da realidade que o circundava. São filmes, em sua grande maioria, que conseguem fugir do escapismo superficial e apresentam um conteúdo riquíssimo (sempre calcado no humor inteligente - mesmo em seus filmes mais sérios).

"Se Meu Apartamento Falasse", obviamente, não foge à regra (não à toa foi ganhador de 5 Oscars e indicado a mais 5 categorias). Aqui, Wilder e seu habitual companheiro de roteiros, I. A. L. Diamond, narram a história de pessoas extremamente comuns, para discutir temas bastante sérios, como adultério, sexo e solidão. E fazem isso da maneira mais simples possível, e esse é o grande mérito e charme do longa.

A construção dos personagens é irretocável, e brinda Jack Lemmon e Shirley Maclaine com verdadeiras 'pessoas': tridimensionais, e repletas de defeitos (que, em sua maioria, se igualam ou superam suas qualidades). Mas obviamente a composição não é mérito exclusivo do roteiro e da direção, e os atores dão um show de interpretação. MacLaine mostra todo seu talento e sua singular beleza; mas o filme é mesmo de Lemmon (senão o melhor ator de todos os tempos, certamente está na lista dos 3 mais). O seu C. C. Baxter está longe de ser o 'mocinho' dos clássicos hollywoodianos e, por mais, que redima-se recuperando sua dignidade ao final, passa o filme inteiro vestindo diferentes máscaras: para os vizinhos, no trabalho, para seu interesse amoroso… Mas, afinal, quem está livre delas? Lemmon certamente nos delicia com uma das melhores atuações da sua carreira (e olha que o páreo é duríssimo!), e vê-lo escorrendo macarrão em uma raquete de tênis é inesquecível!

Além do fator humano, tecnicamente o filme também é excelente, com seus cenários bem construídos (o escritório onde Baxter trabalha é rico em sua perspectiva, enquanto o seu apartamento prima pelos detalhes), e sua trilha musical linda e singela (que lembra um pouco alguns acordes de "Rhapsody in Blue", de George Gershwin, e que Woody Allen utilizou em "Manhattan", de 1979).

Enfim, "Se Meu Apartamento Falasse" é uma das (senão 'a') melhores comédias românticas já realizadas. E dito isso, é interessante notar que apesar de ser uma comédia romântica, há um sentimento de melancolia que perpassa todo o filme, inclusive em seu 'happy end', que termina sem o tão esperado beijo de seus protagonistas. Quando Fran (MacLaine) diz: "cale a boca e dê as cartas" com um sorriso irresistível no rosto, mais do que um impulso romântico desenfreado, está ali simbolizando a cumplicidade daqueles dois personagens.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


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