quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Histórias Cruzadas

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Histórias Cruzadas (The Help, 2011)

Estreia oficial: 10 de agosto de 2011
Estreia no Brasil: 6 de fevereiro de 2012
IMDb



"Histórias Cruzadas", roteirizado e dirigido por Tate Taylor, baseia-se no livro "A Resposta", de Kathryn Stockett. Não posso dizer sobre o livro, pois não o li; mas o filme é uma sucessão de clichês e situações maniqueístas que, em vez de mostrar o preconceito racial e seus efeitos nocivos, prefere apaziguá-los tendo uma 'heroína' branca como porta-voz.

No início da década de 60, Eugenia 'Skeeter' Phelan (Emma Stone) é uma jovem jornalista recém formada que volta à sua cidade natal - Jackson, Mississippi - e enxerga (pela primeira vez aparentemente) as diferenças raciais tão óbvias ali presentes. Ao presenciar acontecimentos preconceituosos que têm relação direta com sua amiga de longa data, Hilly Holbrook (Bryce Dallas Howard) e sua criada Minny (Octavia Spencer); e sua mãe (Allison Janney) e sua antiga babá; 'Skeeter' resolve escrever um livro sobre as histórias dessas e outras empregadas, afim de tornar público o que todos tentam esconder: as barbaridades sofridas por essas mulheres que dão o seu melhor para cuidar das casas e filhos de seus patrões brancos e não possuem nenhum direito trabalhista e, às vezes, são tratadas como sub-humanos, nem sequer podendo utilizar o banheiro da casa de seus empregadores. Para isso, conta com a ajuda de Aibileen Clark (Viola Davis), a primeira negra que a concorda em lhe ajudar.

Acontece que toda essa celeuma racial já é bem conhecida por todos nós (ainda mais quando se trata do sul dos Estados Unidos). E também sabemos que, por mais que hoje em dia essa intolerância seja considerada um ultraje aos direitos humanos, ainda está presente em muitas sociedades (e infelizmente, não podemos ignorar, em nosso próprio país); e, não há muito tempo atrás, era considerada como algo normal ou habitual (principalmente nos estados sulistas estadunidenses), ainda que este país tenha sido um dos primeiros a abolir a escravidão em 1865.

O grande problema do filme de Tate Taylor é que por mais que se trate de uma história sobre essas empregadas, sobre os negros, tudo se dá sob a ótica dos personagens brancos. Faz-se necessário a grande heroína 'Skeeter' - branca - para que as empregadas comecem a ser ouvidas; uma simples refeição preparada pela dona de casa Celia (Jessica Chastain) - branca novamente - faz com que Minny resolva por um fim nos abusos que sofre do marido; é através do livro de 'Skeeter', que Aibillen toma forças para começar a escrever…

Assim, o filme torna-se mais sobre as donas de casa brancas e seus dramas pessoais (e extremamente estereotipados, diga-se de passagem), do que sobre o preconceito e maus tratos que as empregadas recebem. Sem contar que todos os personagens brancos vistos aqui podem ser divididos em dois grupos, os bonzinhos e defensores da igualdade racial; e os malvados, que fazem tudo para manter a separação étnica - e esses são vilões mesmo! Basta dizer que a 'vilã-mor' da história, Hilly, em certo momento surge com uma ferida no rosto, para deixá-la não só feia em seu caráter, mas também repugnante visualmente, como uma verdadeira bruxa.

Sem contar que toda a narrativa é construída sobre clichês estrategicamente colocados para levar o público às lágrimas: há uma personagem que luta contra um câncer, uma garotinha chorando ao ver sua babá partindo para sempre, uma personagem sendo aplaudida por uma multidão pelos seus feitos corajosos, e a tão tradicional cena em que todos se levantam para ajudar em uma causa já tida como perdida…

E todo esse viés invertido do roteiro faz com que as personagens mais interessantes sejam relegadas a segundo plano. Embora a Minny de Octavia Spencer por vezes soe caricata demais, a atriz tem bons momentos. Mas é mesmo a atuação de Viola Davis que faz com que o filme não seja um desastre total, a atriz consegue transmitir a complexidade de sua personagem, e seu conflito de emoções através de pequenos gestos, como uma respiração mais profunda ou um tremer de mãos. (Aliás, Davis é a única que faz jus ao grande alvoroço que se tem feito a respeito das atuações deste longa).

E, para não dizer que só Viola Davis 'salva' o filme, sua direção de arte é impecável em sua recriação de época, tanto em ambientes quanto em seu figurino. O contraste instantâneo entre as espaçosas e luxuosas, mas estéreis de emoção, mansões dos brancos; e as apertadas e pobres, mas acolhedoras, casas dos negros, é sutil mas bastante eficiente, já que o vemos com naturalidade e não como algo que 'salta aos olhos'.

Enfim, contando com um visual maravilhoso, "Histórias Cruzadas" menospreza séculos de segregação racial e preconceitos absurdos em prol de narrar histórias clichês e irrelevantes. Chega a ser desrespeitoso…


por Melissa Lipinski


Um comentário:

Anônimo disse...

Melissa, nao concordo com a sua opiniao do filme. Emma faz o papel dela, e aqui ela nao e considerada heroina, e considerada a narradora. Os criticos americanos reconhecem que o filme transmitou exatamente o relacionamento entre as empregadas e as familias americanas brancas do sul do pais. Esta muito bem retratado. A estrela do filme e Viola Davis, com uma atuacao impecavel que lhe rendeu a indicacao do Oscar como atriz principal. Por favor, se informe mais, aprenda mais sobre a cultura do sul dos Estados Unidos. O filme e de extrema importancia onde tantos negros como brancos podem ter uma ideia do como foi feito a castracao mental nos negros americanos, e para nos negros, mostra a superioridade intelectual que possuimos e com isto saimos daquela posicao de escravos com salario que ocorria no sul do pais naquele tempo. Nao gostei da sua analise mesmo.