segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Chico & Rita

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Chico & Rita (2010)

Estreia oficial: 19 de novembro de 2010
Estreia no Brasil: sem data prevista
IMDb



"Chico & Rita", dirigida por Fernando Trueba, Javier Mariscal e Tono Errando, é uma animação voltada para o público adulto e que conta uma história simples e melodramática por natureza (afinal tem-se o amor - desencontrado e sofrido - e a música como temas centrais aqui).

O roteiro de Trueba e Ignacio Martínez de Pisón conta a história do amor 'caliente' entre Chico, um exímio pianista, e Rita, uma belíssima e sensual cantora com uma voz doce, forte e melodiosa. Porém, nada será tão simples para os dois amantes, e entre idas e vindas, crises de ciúmes e traições, Havana e Nova York, a história dos dois vai se delineando através de várias décadas.

A animação, um misto da tradicional técnica 2D com a tecnologia digital, encanta com seu traço bem delimitado que recria com perfeição paisagens detalhadas das cidades onde a história se passa. A recriação das décadas de 1940 e 50, tanto em Cuba como nos Estados Unidos, é detalhista e de um notável primor. E os detalhes dos traços de Javier Mariscal são incríveis, desde um descascado numa parede de um simplório apartamento de Havana, passando pelas luzes de uma Manhattan vista de navio, até o charme e elegância das ruas de Paris, tudo finalizado com uma iluminação igualmente inspirada.

Chama a atenção também a maneira sensual porém delicada com que os realizadores retratam as cenas de sexo entre o casal. Como falei, é uma animação para adultos e há cenas bastante ousadas, mas que são conduzidas de forma nada vulgar.

E, se a história de amor entre o casal não traz nenhuma novidade e chega a recorrer a alguns clichês em seu percurso, é pontuda bela belíssima trilha musical de Bebo Valdés (músico em quem o personagem de Chico é baseado), que relembra o auge do jazz latino (uma mistura do típico jazz estadunidense com o mambo, e que teve seu expoente com os músicos cubanos que migraram para os EUA nos anos 1950).

Enfim, com um ritmo um pouco oscilante e um final um tanto quanto forçado (ainda que poético), "Chico & Rita" consegue manter-se sobretudo pela força de sua trilha musical, que com canções ora conhecidas, ora nem tanto, embalará a todos nessa aventura amorosa que vale mais pela sua jornada do que pelo seu desfecho propriamente dito.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


 
 

domingo, 12 de fevereiro de 2012

BAFTA 2012

OBS: Clique no nome do filme para ler os comentários. Vencedores em vermelho.

FILME
- O Artista (The Artist)
- Os Descendentes (The Descendants)
- Drive (Drive)
- Histórias Cruzadas (The Help)
- O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)

FILME BRITÂNICO
- Sete Dias com Marilyn (My Week with Marilyn)
- Senna
- Shame
- O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)
- Precisamos Falar Sobre o Kevin (We Need to Talk About Kevin)

ESCRITOR, DIRETOR OU PRODUTOR ESTREANTE
- Joe Cornish (Diretor | Escritor) - Ataque ao Prédio (Attack the Block)
- Will Sharpe (Diretor | Escritor), Tom Kingsley (Diretor), Sarah Brocklehurst (Produtora) - Black Pond
- Ralph Fiennes (Diretor) - Coriolanus
- Richard Ayoade (Diretor | Escritor) - Submarine
- Paddy Considine (Diretor), Diarmid Scrimshaw (Produtor) - Tyrannosaur

FILME EM LÍNGUA ESTRANGEIRA
- Incêndios (Incendies)
- Pina
- Potiche - Esposa Troféu (Potiche)
- A Separação (Jodaeiye Nader az Simin)
- A Pele que Habito (La Piel que Habito)

DOCUMENTÁRIO
- George Harrison: Living in the Material World
- Projeto Nim (Project Nim)
- Senna

ANIMAÇÃO
- As Aventuras de Tintim (The Adventures of Tintin)
- Operação Presente (Arthur Christmas)
- Rango (Rango)

DIRETOR
- Michel Hazanavicius - O Artista (The Artist)
- Nicolas Winding Refn - Drive
- Martin Scorsese - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Tomas Alfredson - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)
- Lynne Ramsay - Precisamos Falar Sobre o Kevin (We Need to Talk About Kevin)

ROTEIRO ORIGINAL
- Michel Hazanavicius - O Artista (The Artist)
- Annie Mumolo, Kristen Wiig - Missão Madrinha de Casamento (Bridesmaids)
- John Michael McDonagh - O Guarda (The Guard)
- Abi Morgan - A Dama de Ferro (The Iron Lady)
- Woody Allen - Meia-Noite em Paris (Midnight in Paris)

ROTEIRO ADAPTADO
- Alexander Payne, Nat Faxon, Jim Rash - Os Descendentes (The Descendants)
- Tate Taylor - Histórias Cruzadas (The Help)
- George Clooney, Grant Heslov, Beau Willimon - Tudo Pelo Poder (The Ides of March)
- Steven Zaillian, Aaron Sorkin - O Homem que Mudou o Jogo (Moneyball)
- Bridget O'Connor, Peter Straughan - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)

ATOR
- Brad Pitt - O Homem que Mudou o Jogo (Moneyball)
- Gary Oldman - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)
- George Clooney - Os Descendentes (The Descendants)
- Jean Dujardin - O Artista (The Artist)
- Michael Fassbender - Shame

ATRIZ
- Bérénice Bejo - O Artista (The Artist)
- Michele Williams - Sete Dias com Marilyn (My Week with Marilyn)
- Tilda Swinton - Precisamos Falar Sobre o Kevin (We Need to Talk About Kevin)
-Viola Davis - Histórias Cruzadas (The Help)

ATOR COADJUVANTE
- Christopher Plummer - Toda Forma de Amor (Beginners)
- Jim Broadbent - A Dama de Ferro (The Iron Lady)
- Jonah Hill - O Homem que Mudou o Jogo (Moneyball)
- Kenneth Branagh - Sete Dias com Marilyn (My Week with Marilyn)
- Philip Seymour Hoffman - Tudo Pelo Poder (The Ides of March)

ATRIZ COADJUVANTE
- Carey Mulligan - Drive
- Jessica Chastain - Histórias Cruzadas (The Help)
- Judi Dench - Sete Dias com Marilyn (My Week with Marilyn)
- Melissa McCarthy - Missão Madrinha de Casamento (Bridesmaids)
- Octavia Spencer - Histórias Cruzadas (The Help)

TRILHA SONORA
- Ludovic Bource - O Artista (The Artist)
- Trent Reznor, Atticus Ross - Millennium - Os Homens que Não Amavam as Mulheres (The Girl with the Dragon Tattoo)
- Howard Shore - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Alberto Iglesias - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)
- John Williams - Cavalo de Guerra (War Horse)

FOTOGRAFIA
- Guillaume Schiffman - O Artista (The Artist)
- Jeff Cronenweth - Millennium - Os Homens que Não Amavam as Mulheres (The Girl with the Dragon Tattoo)
- Robert Richardson - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Hoyte van Hoytema - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)
- Janusz Kaminski - Cavalo de Guerra (War Horse)

EDIÇÃO
- Anne-Sophie Bion, Michel Hazanavicius - O Artista (The Artist)
- Mat Newman - Drive
- Thelma Schoonmaker - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Gregers Sall, Chris King - Senna
- Dino Jonsater - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)

DESIGN DE PRODUÇÃO
- Laurence Bennett, Robert Gould - O Artista (The Artist)
- Stuart Craig, Stephenie McMillan - Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 2 (Harry Potter and the Deathly Hallows: Part 2)
- Dante Ferretti, Francesca Lo Schiavo - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Maria Djurkovic, Tatiana MacDonald - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)
- Rick Carter, Lee Sandales - Cavalo de Guerra (War Horse)

FIGURINO
- Mark Bridges - O Artista (The Artist)
- Sandy Powell - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Michael O'Connor - Jane Eyre
- Jill Taylor - Sete Dias com Marilyn (My Week with Marilyn)
- Jacqueline Durran - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)

MAQUIAGEM E CABELO
- Julie Hewett, Cydney Cornell - O Artista (The Artist)
- Amanda Knight, Lisa Tomblin - Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 2 (Harry Potter and the Deathly Hallows: Part 2)
- Morag Ross, Jan Archibald - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Jenny Shircore - Sete Dias com Marilyn (My Week with Marilyn)

SOM
- Nadine Muse, Gérard Lamps, Michael Krikorian - O Artista (The Artist)
- James Mather, Stuart Wilson, Stuart Hilliker, Mike Dowson, Adam Scrivener - Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 2 (Harry Potter and the Deathly Hallows: Part 2)
- Philip Stockton, Eugene Gearty, Tom Fleischman, John Midgley - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- John Casali, Howard Bargroff, Doug Cooper, Stephen Griffiths, Andy Shelley - O Espião que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy)
- Stuart Wilson, Gary Rydstrom, Andy Nelson, Tom Johnson, Richard Hymns - Cavalo de Guerra (War Horse)

EFEITOS VISUAIS
- Joe Letteri - As Aventuras de Tintim (The Adventures of Tintin)
- Rob Legato, Ben Grossman, Joss Williams - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo)
- Joe Letteri, Dan Lemmon, R. Christopher White - Planeta dos Macacos: A Origem (Rise of the Planet of the Apes
- Ben Morris, Neil Corbould - Cavalo de Guerra (War Horse)

CURTA-METRAGEM DE ANIMAÇÃO
- Afarin Eghbal, Kasia Malipan, Francesca Gardiner - Abuelas
- Robert Morgan - Bobby Yeah
- Grant Orchard, Sue Goffe - A Morning Stroll

CURTA-METRAGEM
- Martina Amati, Gavin Emerson, James Bolton, Ilaria Bernardini - Chalk
- Rungano Nyoni, Gabriel Gauchet - Mwansa the Great
- Arash Ashtiani, Anshu Poddar - Only Sound Remains
- John Maclean, Gerardine O'Flynn - Pitch Black Heist
- Babak Anvari, Kit Fraser, Gavin Cullen - Two and Two

THE ORANGE WEDNESDAYS RISING STAR AWARD (voto do público)
- Adam Deacon
- Chris Hemsworth
- Chris O'Dowd
- Eddie Redmayne
- Todd Hiddleston

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Gigantes de Aço

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Gigantes de Aço (Real Steel, 2011)

Estreia oficial: 7 de outubro de 2011
Estreia no Brasil: 21 de outubro de 2011
IMDb



"Gigantes de Aço" é uma versão futurista de "Falcão - O Campeão dos Campeões". Substitua Sylvester Stallone por Hugh Jackman, a queda de braço por boxe entre robôs e o garotinho enjoado do filme de 1987 por outro carismático e divertido e, voilà! Ou até poderia ser uma mistura de "Falcão" com "Rocky", sendo que o boxe dá-se entre robôs… Enfim, comparações à parte, o longa dirigido por Shawn Levy é previsível ao extremo e maniqueísta, porém surpreendentemente, conta com a dose certa de carisma de seus protagonistas e cenas de lutas impressionantes, o que tornam um passatempo bastante divertido e agradável.

A história? Bom… Em 2020, graças à sede dos espectadores por violência, o boxe deixou de ser protagonizado por humanos e passou a ser feito por robôs. E cada luta  termina com a destruição de um dos oponentes. Charlie Kenton (Jackman) é um ex-lutador que não largou o esporte, e se transformou em um controlador desses robôs. Porém, sem tino algum para os negócios, Kenton endividou-se até o último fio de cabelo e sua reputação não é lá das melhores. Nem mesmo sua fã e namorada da adolescência, Bailey (Evangeline Lilly), filha de seu ex-treinador, parece não botar mais fé no sujeito. Para piorar a situação, Charlie descobre que uma ex-namorada acaba de morrer, fazendo com que tenha que conviver com seu filho de 11 anos, Max (Dakota Goyo), com quem, até então, não mantinha contato. A partir daí, os dois vão descobrir um antigo robô em um ferro velho, Atom, e, contrariando todas as expectativas, transformá-lo em um verdadeiro lutador, contando, para isso, com a indefectível esperança de Max, e os talentos como lutador de boxe de Charlie.

O roteiro escrito por John Gatins (a partir de um conto de Richard Matheson), como falei, é repleto de clichês e, em 10 minutos de filme, já sabemos como tudo terminará. Porém, graças à dinâmica edição de Dean Zimmerman, e as mais que inspiradas lutas entre os robôs, Levy consegue imprimir um ótimo ritmo à sua narrativa, intercalando de forma balanceada cenas de maior ação, com outras mais engraçadinhas ou com um maior apelo dramático.

E são as lutas dos robôs que realmente chamam a atenção. Desde o layout de seus protagonistas, que impressionam pela verossimilhança e por seus movimentos e golpes: assim, se Atom pode sugerir emoções com seus olhos que sempre parecem tristes (chega a lembrar "O Gigante de Ferro", de 1999); o campeão mundial Zeus, em contrapartida, tem uma aparência fria e golpes mortais, que, desde sua primeira aparição não deixa dúvidas quanto à sua superioridade (tanto tecnológica quanto 'muscular', digamos assim). Até as lutas em si, que surpreendem não apenas pela violência (constantemente há braços e cabeças arrancados; com poças de óleo que se espalham como se fossem sangue), mas principalmente pelo dinamismo de sua montagem e pela qualidade de sua edição de som.

Mas grande parte do acerto de "Gigantes de Aço" também reside em seu elenco. Hugh Jackman, sempre carismático, confere o tom certo a Charlie: meio pilantra, meio boa pinta; ao mesmo tempo insuportável e irresistível. Já o garoto Dakota Goyo transforma seu Max em uma criança diferente daquelas que comumente se vê em filmes onde 'o pai ausente tem que conquistar o respeito e amor do filho'. Inteligente e decidido, ele foge do estereótipo do menino mimado e cheio de vontades. O luxo com que o menino viveu até sua mãe morrer, não serviu para transformá-lo em um desses 'pentelhos' que se vê nos filmes do gênero, mas para colocá-lo em contato com a mais alta tecnologia, fazendo-o ser o 'autor' ou 'co-autor' das ações em que se envolvem, e não apenas um 'espectador'. Mas não se enganem! A construção dos personagens não é nenhuma maravilha, e os clichês estão presentes; porém são bem administrados e 'mascarados' com uma boa dose de carisma de seus protagonistas.

Enfim, Shawn Levy conseguiu dar uma nova roupagem a fórmulas mais do que conhecidas, transformando-as em um passatempo descompromissado e divertido e que - e isso é o mais importante - não desrespeitam a inteligência do espectador.


por Melissa Lipinski


terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O Artista

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Artista, O (The Artist, 2011)

Estreia oficial: 12 de outubro de 2011
Estreia no Brasil: 10 de fevereiro de 2012
IMDb



Quando vemos George Valentin (Jean Dujardin), o protagonista de "O Artista", pela primeira vez, logo no início do longa, as primeiras palavras que saem da sua boca são: "Não vou falar! Não direi uma palavra". Palavras essas que, logo após serem pronunciadas sem emissão alguma de som, aparecem escritas em uma cartela. E não demora muito para descobrirmos que na verdade, esta cena faz parte de um filme protagonizado por Valentin, um renomado ator do cinema mudo em Hollywood. E assim, logo em sua primeira cena, o diretor Michel Hazanavicius dita o tom de seu filme: sim, estamos assistindo a uma versão moderna do cinema mudo, que vai falar exatamente sobre a transição deste para o falado (ou os 'talkies', como diziam na época nos Estados Unidos), e ainda repleto de metalinguagem - afinal não apenas o personagem de Geroge Valentin nega-se a dizer uma palavra, como ele próprio (personagem de Dujardin), negar-se-á a 'abraçar' o cinema falado, acreditando (assim como vários grandes atores realmente acreditavam à época) que o som apenas destruiria a magia do Cinema.

Mas estou me adiantando… O roteiro, escrito pelo próprio Hazanavicius, é como uma mistura de "Cantando na Chuva" com "Nasce uma Estrela". George Valentin, como falei, é um grande astro de Hollywood e, em uma estreia, acaba esbarrando com a carismática Peppy Miller (Bérénice Bejo), que dá um beijo no rosto do grande ator. Claro que o fato vira manchete dos principais jornais e, agarrando-se à oportunidade, Peppy vai para Hollywoodland (como então se chamava) tentar a carreira de atriz. E consegue, ainda mais com o advento do som. E acaba se tornando uma das principais estrelas desta fase. Já George Valentin, negando-se a se atualizar, acaba sendo esquecido pelos 'holofotes', e entra em uma grande crise, tanto econômica quanto pessoal.

A história não traz nada de novo, e é até um tanto quanto previsível, mas é a forma como é contada aqui, o grande diferencial de "O Artista". Colocando-se desde o princípio não como uma crítica à Hollywood (como "Crepúsculo dos Deuses", ao qual muitos poderão achar várias similaridades), mas sim como uma grande homenagem à indústria cinematográfica estadunidense, "O Artista" recria em (quase) tudo a estrutura narrativa dos filmes mudos do final da década de 1920. Desde o formato 'square' ou standard (4x3) dos antigos filmes, como muitas transições e efeitos (a sobreposição de imagens, por exemplo) que eram comuns nestes filmes, e também a constante trilha musical (de Ludovic Bource) presente em praticamente todas as cenas e que dita o ritmo e o tom da narrativa, como realmente acontecia, sem apelar para o óbvio.

Porém, o longa de Hazanavicius também é bastante contemporâneo, com sua qualidade de imagem límpida e sua montagem dinâmica e inteligente, e que conta com transições e 'trucagens' bastante inspiradas, como no plano em que vemos Peppy maquiar-se na frente do espelho, sendo que sua própria mão é, rapidamente, substituída pelas mãos de maquiadoras profissionais, marcando assim, a sua ascenção na carreira.

Mas embora toda a homenagem a Hollywood seja belamente retratada e garanta um grande charme à producão, são mesmo as atuações que elevam o valor de "O Artista". E é engraçado (pra não dizer irônico) que os grandes protagonistas deste filme não sejam estadunidenses: Jean Dujardin é francês (lembrando que o longa é uma co-produção entre França e Bélgica) e Bérénice Bejo é nascida na Argentina mas cresceu em Paris.

Dujardin cria seu George Valentin como uma mistura de Rodolfo Valentino (a homenagem está até no seu nome) e Douglas Fairbanks (principalmente no bigode), onde sua simpatia equivale-se em tamanho ao seu orgulho. E quanto a Bérénice Bejo, não há como não se apaixonar por sua Peppy, com seu olhos marcantes e sorriso gigantesco, tamanho seu carisma, simpatia e expressividade. Há ainda o ótimo trabalho de John Goodman como um produtor de um grande estúdio, e James Cromwell como o motorista de Valentin. Assim como a pequena participação de Malcolm McDowell. Como não há falas, os atores podem brincar com sua expressão facial e corporal, fazendo isso de maneira extremamente hábil e conseguindo fugir das armadilhas fáceis dos estereótipos.

Mas quem rouba mesmo a cena é o engraçadíssimo cachorrinho de George Valentin. Um verdadeiro ator, extremamente treinado e ensinado, encanta a todos com seus truques e sua lealdade. A ótima cena do café da manhã já bastaria por ser uma homenagem a "Cidadão Kane", mas ganha um tom mais engraçado devido à atuação do carismático animal.

Contando ainda com uma bela fotografia que, em alguns momentos, lembra o expressionismo alemão; uma direção de arte e figurinos impecáveis; e uma edição de som (de uma cena em particular) que chama a atenção pelo seu apuro e originalidade, "O Artista" não é apenas uma homenagem ao cinema mudo, mas a Hollywood como um todo. Afinal, de uma forma engraçada e comovente, leva-nos a um passeio por dentro de parte da história do Cinema, que vai culminar com o advento do gênero que determinou de maneira definitiva a soberania de Hollywood mundialmente: os musicais.

E, se não bastasse a coragem e ousadia de Michel Hazanavicius em produzir um filme mudo em plena era do 3D, ele ainda o faz com extrema segurança e talento, colocando "O Artista" no rol daqueles grandes filmes metalinguísticos e que reverenciam a própria história do Cinema.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski
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Surpreendente. Em pleno 2012 assistir a um filme mudo no cinema. Um lançamento.

"O Artista" consegue ter uma boa história que pode ser contada com pouquíssimas falas. E obviamente as falas vêm escritas em tela preta.

O elenco está muito bem. Destaque para a bela atuação de John Goodman. E um super destaque para o cachorro, toda vez que aparece ele rouba a cena.

A mixagem de áudio é muito boa nas duas cenas em que há sons. Bem como a trilha sonora que apesar da necessidade de estar presente o tempo todo, não nos cansamos dela.

Vale a pena!


por Oscar R. Júnior


segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Um Gato em Paris

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Gato em Paris, Um (Une Vie de Chat, 2010)

Estreia oficial: 15 de dezembro de 2010
Estreia no Brasil: 21 de outubro de 2011
IMDb



"Um Gato em Paris" é uma animação mais voltada para o público adulto. Claro que há um apelo infantil (afinal trata-se de um desenho - o que, naturalmente, 'chama' os espectadores mais novos) que se dá por algumas gags visuais (como o hilário cachorrinho que não pára de latir) e, principalmente, por causa do personagem central da narrativa: o gato Dino.

Dino tem uma vida dupla. Durante o dia, é o inofensivo e carinhoso bichinho de estimação da menina Zoé, que vê nele seu principal companheiro já que todos os dias é deixada somente com a babá quando sua mãe, Jeanne - delegada de polícia, vai trabalhar. Zoé sofreu um trauma quando seu pai (que também era policial) foi assassinado, e desde então não diz uma palavra; e sua mãe, apesar de bastante carinhosa, não cansa de perseguir o mafioso Victor Costa, responsável pela morte de seu marido. Porém, durante a noite, o gato Dino transforma-se no parceiro de crime do ladrão Nico, que escala prédios e casas, esgueira-se pelas fachadas, entra por janelas e chaminés para roubar dos mais abastados. E, quando os dois donos de Dino por acaso se encontram, perseguidos pelo perigoso Victor Costa é que toda a ação realmente começa.

Com um roteiro extremamente enxuto, Alain Gagnol (que co-dirige o longa com Jean-Loup Felicioli) consegue contar sua história sem enrolações, indo direto ao ponto. Essa brevidade, no entanto, acaba dando pouco tempo para que seus personagens consigam se desenvolver melhor. O que é realmente uma pena, pois se o que já ficamos conhecendo deles nos encanta, imaginem se realmente fossem melhor desenvolvidos?

Porém, se tanto cuidado não é dado aos personagens, o mesmo não se pode dizer do visual do filme, e engana-se quem pensa que a animação tradicional 2D traz menos detalhes que uma animação totalmente digital oou em 3D, por exemplo. Com cenários estilizados e bastante coloridos, não são poucas vezes que paredes, tetos e chão confundem-se devido à perspectiva - e não devido a uma 'falha' ou 'incompetência', mas para criar o tom certo para a narrativa, dando um quê de confusão e até apressão.

Já os personagens são desenhados com rostos longos e angulosos, cujos perfis muito lembram os rostos pintados pelo italiano, Modigliani. E se Dino e Zoé são retratados de forma mais infantil, por motivos óbvios; chamam a atenção os movimentos de Nico, que age como um verdadeiro gato pela noite parisiense, sendo a personificação perfeita da palavra 'gatuno'.

Mas não apenas os traços da animação são louváveis, as composições de quadro também chamam a atenção, como a cena que se passa totalmente no escuro, e que aproxima o espectador de Nico, colocando-os como os únicos capazes de ver o que está acontecendo. Ou aquela em que mostra Zoé e sua mãe tomando café da manhã, com um ladrilho com um coração solitário atrás de cada uma delas, representando tanto o carinho que as une, como a distância que se formou entre elas.

Contando também com referências a alguns filmes de gângster, como "Os Bons Companheiros" - Victor Costa zomba de um de seus capangas por causa de um quiche - e "Cães de Aluguel" - há uma discussão que envolve apelidos; o longa trás ainda vários elementos deste gênero cinematográfico, que dão uma certa atmosfera noir para a narrativa; além de uma eficiente cena de ação final, que se passa nos telhados da Catedral de Notre-Dame.

Enfim, "Um Gato em Paris" é um bem-vindo resgate da antiga técnica de animação em 2D, provando que bons filmes não são fruto apenas dos mais requintados e elaborados recursos tecnológicos. Com um bom roteiro se vai longe…

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Amor na Tarde

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Amor na Tarde (Love in the Afternoon, 1957)

Estreia oficial: 29 de maio de 1957

"Amor na Tarde" foi o primeiro filme que Billy Wilder escreveu com I. A. L. Diamond, seu companheiro no roteiro de 12 filmes, numa parceria que rendeu 12 longas-metragem, até o fim de suas carreiras.

A trama fala a respeito de Ariane (Audrey Hepburn), a filha de um detetive particular, Claude Chavasse (Maurice Chevalier), e que acaba se apaixonando por um dos 'casos' de seu pai. Contratado para investigar uma suspeita de adultério, Chavasse, considerado o melhor detetive da França, descobre que a tal esposa encontra-se, todas as tardes na suíte 14 do Hotel Ritz, com um estadunidense, verdadeiro 'casanova', que coleciona casos amorosos ao redor do mundo. Frank Flannagan (Gary Cooper), o tal sujeito, possui uma rotina nas suas conquistas: leva as mulheres para o hotel, pede um farto jantar e chama uma trupe de músicos, The Gypsies, que tocam sempre as mesmas músicas, terminando a rotina com "Fascinação"; quando então, deixam o casal sozinho. Ciente disso, o marido traído vai ao Ritz disposto a matar Flannagan. Como Ariane havia escutado toda a conversa de seu pai com o cliente dele, vai até lá e impede o crime passional. Acontece que a moça inocente, mas cheia de imaginação, acaba se apaixonando pelo sedutor 'Don Juan'. Porém, Ariane não revela quem é para Flannagan, o que faz com que ele se sinta ainda mais atraído por ela, apesar de não se envolver amorosamente com mulher alguma. E mais: a moça acaba inventando uma série de casos, baseados em suas leituras dos relatórios de seu pai, e fazendo o experiente amante pensar que ela leve uma vida similar a dele, repleta de experiências amorosas.

Situando a trama na capital francesa, Wilder e Diamond, de forma discreta e narrando os hábitos amorosos dos parisienses, conseguem criticar os costumes puritanos dos estadunidenses. Já no início do longa, Chavasse diz em uma narração em off: "Esta é a cidade - Paris, França - que é igual a qualquer outra grande cidade - Londres, Nova York, Tóquio… Exceto por duas pequenas coisas: em Paris as pessoas comem melhor; e em Paris as pessoas fazem amor… Bem, talvez não melhor, mas certamente, mais vezes". Não que haja cenas de sexo ou mais ousadas (pelo menos atualmente) no filme, afinal era 1957 e o Código Hays ainda estava em vigor em Hollywood. Mas o cineasta cria passagens de total intimidade entre Frank e Ariane, além de várias insinuações sobre o ato sexual em si, como a moça arrumando os cabelos depois de acabado todo o ritual de Flannagan e ainda passar horas na suíte do Hotel Ritz; ou num outro encontro, quando deixa um casaco cair a seus pés, numa menção a estar se despindo.

Mas o que encanta na história é como Wilder consegue fazer com que nos interessemos por aqueles personagens. E claro que a composição dos atores é parte fundamental nisso. Audrey Hepburn (no auge de sua beleza), cria uma moça inexperiente, mas cheia de criatividade e carisma. A forma como ela inventa suas história para Frank é divertidíssima, e quando a vemos falar, é como se ela realmente estivesse criando tudo aquilo na hora, tamanha é a sua espontaneidade. Já Gary Cooper interpreta uma versão de si mesmo (afinal o ator era conhecido por seus diversos - diversos mesmo - casos amorosos com colegas de profissão, mesmo sendo casado - numa união que durou até o fim da sua vida), e aparenta muito à vontade com seu irresistível sedutor. Completando o competente elenco, está Maurice Chevalier, na perfeita personificação do ditado "casa de ferreiro, espeto de pau", já que, tão astuto e observador em seus casos, não é capaz de notar por quem sua filha está se apaixonando (mesmo que essa não pare de cantarolar "Fascinação").

Contando ainda com ótimos diálogos - o que é praxe nos filmes do diretor - "Amor na Tarde" não é só romance, tem também uma boa cota de humor, com gags divertidíssimas - a maioria incluindo o grupo musical The Gypsies.

Enfim, seguindo os passos de seu mestre, Ernst Lubitsch, Billy Wilder consegue criar uma comédia romântica despretensiosa, com ótimos e cínicos diálogos, personagens carismáticos e principalmente, que revela-se ser muito mais crítica aos costumes e hipocrisias (dos Estados Unidos) do que aparenta numa olhada superficial.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski