quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Eu Queria Ter a Sua Vida

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Eu Queria Ter a Sua Vida (The Change-Up, 2011)

Estreia oficial: 5 de agosto de 2011
Estreia no Brasil: 7 de outubro de 2011
IMDb



"Eu Queria Ter a Sua Vida" é a junção de dois subgêneros de comédias: a tão batida comédia de troca de corpos (lembro de produções desde 1976 com "Se Eu Fosse a Minha Mãe", depois "Tal Pai, Tal Filho" de 1987, "Quero Ser Grande" de 1988, passando pelas as regravações "Sexta-Feira Muito Louca de 2003, "De Repente 30" de 2004, até os nacionais "Se Eu Fosse Você" 1 e 2), e o subgênero cômico voltado para o público masculino, com suas escatologias e uma ode ao adulto-infantilizado (basta ver os sucessos de "Dias Incríveis" de 2003, "Penetras Bons de Bico" de 2005, "Se Beber Não Case" 1 e 2 - 2009 e 2011, "A Ressaca" e "Um Parto de Viagem", ambos de 2010, entre tantos outros).

Porém, este filme dirigido por David Dobkin não alcança o nível destes exemplares que citei, já que não ousa, nem em seu formato, nem em suas piadas. Trabalhando com um formato extremamente desgastado, os roteiristas Jon Lucas e Scott Moore não souberam investir nas situações que criaram, deixando-as sempre 'mornas'.

Diferentemente dos melhores filmes do subgênero comédias masculinas (e tomo "Dias Incríveis", "Penetras Bons de Bico" e "Se Beber Não Case" como parâmetro), os roteiristas não souberam abusar de situações esdrúxulas e piadas escatológicas para contrapor uma premissa já conhecida do grande público. O resultado é um filme que até tem boas chances, mas nunca as concretiza de fato, pois não as leva até o limite do tolerável (como os filmes citados faziam). E você poderá até soltar algumas risadas (afinal este é o propósito de uma comédia, não é mesmo?), mas não chegará a gargalhar em nenhum momento…

Porém, o longa conta com boas atuações de Jason Bateman e Ryan Reynolds, que parecem bem à vontade com seus personagens - Dave e Mitch respectivamente - e realmente estarem se divertindo com a possibilidade de interpretar 'um ao outro'. Assim, vemos Bateman comportar-se como Mitch e Reynolds como Dave de forma convincente e divertida. Porém seus personagens são estereótipos que vão entregando-se cada vez mais às convenções formuláicas dos filmes do gênero.

E o que é pior! No terço final, o diretor (apoiado no roteiro, é claro) desiste totalmente da tentativa de fazer graça e descamba para um desfecho moralista e piegas, que enfraquece ainda mais a produção.

Enfim, não trazendo nada de novo (tanto em conteúdo quanto em formato, "Eu Queria Ter a Sua Vida" apenas respira graças ao carisma e simpatia de seus protagonistas.


por Melissa Lipinski


sábado, 26 de novembro de 2011

Late Bloomers - O Amor Não Tem Fim

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Late Bloomers - O Amor Não Tem Fim (Late Bloomers, 2011)

Estreia oficial: 13 de julho de 2011
Estreia no Brasil: 11 de novembro de 2011
IMDb



Depois de sua estreia na direção de longas de ficção com "A Culpa É do Fidel" (de 2006), Julie Gavras volta a mostrar sutileza, charme e senso de humor para tratar de temas delicados. Se no seu filme anterior conseguia retratar de maneira inocente e séria - e sempre privilegiando o ponto de vista infantil - a imersão de uma menina no mundo do ativismo político de seus pais na década de 1970; agora, com esse "Late Bloomers" (com terrível subtítulo nacional) vai ao outro extremo da maturidade, e fala justamente do difícil ato de envelhecer. Afinal, como diz um dos personagens do filme: "envelhecer não é para mariquinhas" ("getting old ain't for sissys").

Depois de uma perda de memória parcial, a 'sessentona' Mary (Isabella Rossellini, ainda linda nos seus bem envelhecidos - e assumidos - 60 anos - como é bonita uma mulher que não tenta esconder e disfarçar sua idade com plásticas deformantes e desnecessárias) decide que é hora de assumir a idade que tem, e passa a abastecer sua casa com acessórios para a terceira idade, tentando adaptar-se a um novo estilo de vida, mais sossegado e cuidadoso. Já seu marido, Adam (William Hurt), cercado de colegas de trabalhos bem mais novos, parece ignorar o fato que Maria pretende assumir de qualquer maneira, e faz de tudo para parecer mais jovem.

Mas como agir de maneira coerente com sua idade? Qual a forma correta? Como deixar de querer ter 20 anos e, ao mesmo tempo, também não aparentar ter 80? São questões que o roteiro de Julie Gavras e Olivier Dazat aborda com sensibilidade e destreza, sem cair no piegas ou no caricato.

E parte do êxito do filme está no talento de seus protagonistas e na empatia que esses criam com o público. Porém, por mais delicada e bem conduzida que a história possa ser, ela perde um pouco de sua força por nunca se aprofundar nos temas que levanta como conflito. Sempre que ameaça ir mais a fundo em um ponto, uma situação mais cômica vem suavizar a trama, e abranda o que poderia ter se tornado um grande estudo sobre a maturidade.

Porém, Gavras (assim como acontecia em "A Culpa É do Fidel") consegue conduzir a trama com tamanho charme que nos deixamos levar pelos seus acontecimentos, por mais que, ao final, notemos que sua discussão foi sutil e, até mesmo, rasa.

O bom ritmo do longa, sua bonita fotografia e suas excelentes atuações transformam "Late Bloomers" em um romance da "melhor" idade leve e despretensioso, mas que também acaba por nos fazer refletir sobre aquilo que nos é inevitável: envelhecer.

Porém, como Julie Gavras e Mary (ou Isabella Rossellini) nos mostram: há que se envelhecer mas sem perder o bom senso e a compostura jamais.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Vejo Você no Próximo Verão

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Vejo Você no Próximo Verão (Jack Goes Boating, 2010)

Estreia oficial: 24 de setembro de 2010
Estreia no Brasil: 22 de julho de 2011
IMDb



O grande diferencial de "Vejo Você no Próximo Verão" é o seu casal protagonista. Ou melhor, o quão deprimidos ou deprimentes são esses personagens. Além de marcar a estreia do grande ator Philip Seymour Hoffman na direção.

Escrito por Robert Glaudini (inspirado em sua própria peça teatral), a trama acompanha dois casais - um já formado e desgastado, e outro que está tentando se juntar - em sua busca por alguma coisa na vida: um simples afeto, um relacionamento ou a significação para uma vida vazia. Clyde (John Ortiz) é o melhor amigo de Jack (o próprio Philip Seymour Hoffman), e ambos trabalham como motoristas de limusines; ele é casado com Lucy (Daphne Rubin-Vega). E, mesmo com todos os problemas em seu casamento, eles decidem aproximar Jack de Connie (Amy Ryan).

E é a partir dos encontros entre essas quatro pessoas que a trama vai evoluindo e os personagens vão modificando-se (sobretudo Jack, que é quem 'leva' a história).

Porém, o Philip Seymour Hoffman diretor não se sai tão bem quanto o ator. Criando uma narrativa pouco fluida, a história parece que não evolui de forma orgânica, principalmente nos dois terços iniciais. Porém, quando Hoffman, no terço final, concentra a ação dentro do apartamento de Clyde e Lucy em um jantar que acaba numa discussão digna de "Quem Tem Medo de Virginia Wolf?" (impossível não se lembrar desse filme nesta parte), parece 'acertar' a mão. E, talvez por sua origem teatral, quando neste momento, a trama foca-se em um só ambiente e nos conflitos pessoais exteriorizados pelos diálogos, ele ganha em força, tensão e dinâmica. Pena que isso só aconteça ao final.

Mas, como ator, Hoffman compõe um personagem repleto de nuances e sutilezas, que o tornam tridimensional e 'real'. Na maior parte do tempo apático, o ator/diretor não tem medo de mostrar Jack como sendo desprovido de qualquer vaidade (e seu figurino consegue refletir muito bem seu caráter), assim como um sujeito que escuta conselhos de todos, sendo praticamente 'levado' de um lado para outro. Assim, quando Connie entra em sua vida, testemunhamos a transformação gradual do sujeito, que começa a tomar decisões que mudarão (mas nem tanto) quem ele é. E é de forma delicada, singela e tocante que Philip Seymour Hoffman faz Jack sair de sua apatia habitual aprendendo coisas novas para tentar agradar seu interesse amoroso.

Mas não é só a atuação de Hoffman que se sobressai. Como diretor, ele também abre espaço para que todos os outros protagonistas dessa história consigam se destacar. Seja Amy Ryan como uma mulher carente mas a procura da felicidade mesmo nos momentos mais difíceis. Ou Jack Ortiz que esconde a infelicidade e angústia pessoal de Clyde em um semblante sempre alegre e brincalhão. Ou Daphne Rubin-Vega que cria sua Lucy exatamente de forma oposta a do marido: com a maioria das pessoas é comunicativa e alegre, já com Clyde torna-se fechada e mal humorada. Enfim, o filme torna-se melhor devido à força de suas atuações e à composição de seus personagens.

Estreando de forma promissora, Philip Seymour Hoffman pode até não ter realizado um filme memorável em seu debut, mas delicado e encantador o suficiente para que possamos enxergar a felicidade mesmo nas pequenas coisas da vida, como a promessa de um passeio de barco, ou de um jantar feito com amor e dedicação.


por Melissa Lipinski


quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O Dublê do Diabo

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Dublê do Diabo, O (The Devil's Double, 2011)

Estreia oficial: 10 de agosto de 2011
Estreia no Brasil: sem data prevista
IMDb



"O Dublê do Diabo", do diretor Lee Tamahori, baseia-se em fatos reais, e conta parte da vida de Latif Yahia, que foi o dublê de Uday Saddam Hussein, filho mais velho do ex-ditador iraquiano.

Como o roteiro de Michael Thomas parte do livro escrito pelo próprio Latif, o ponto de vista é apenas dele. Assim, vemos apenas um lado da história. E, se isso pode até não ser o maior 'pecado' do filme, também é o fator que o enfraquece, e transforma seus personagens em pouco mais do que caricaturas.


Assim, Uday Hussein é visto, como diz o título, como o diabo em pessoa. E é isso. Suas atitudes (todas vis e inescrupulosas) são tomadas apenas porque ele é mau e pronto. Nunca entendemos quem realmente é aquela pessoa, suas reais motivações. Vejam bem, não estou defendendo o 'real' Uday (que publicamente sabia-se ser um crápula), mas a construção de um personagem que, por mais que seja baseado em alguém real, ainda é um personagem; e, como toda obra de ficção, precisa ter coerência e unidade dentro daquilo que se propõe (pelo menos ao meu ver). Mas enfim… O mesmo também pode ser dito de Latif, que passa a ser um mártir, porém sem realmente entendermos quem ele era antes de ser o sósia do filho de Saddam, e isso enfrquece-o, pois não nos identificamos com ele como 'pessoa', mas sim por ele ser o bonzinho em oposição ao malvado Uday.

Limitando-se aos acontecimentos revoltantes que tornaram-se públicos da vida de Uday, o roteiro contenta-se em encená-los, porém sem se preocupar muito com suas consequências ou efeitos sobre os demais personagens.

Há ainda a personagem de Ludivine Sagnier (Sarrab) que nada tem a acrescentar à trama, servindo apenas para que haja um interesse amoroso do herói, e potencializar ainda mais o drama de Latif, já que a moça é 'a preferida' de Uday.

Porém, Lee Tamahori consegue imprimir um bom ritmo à narrativa, conferindo-lhe agilidade. E há também a competente e bela fotografia de Sam McCurdy (ainda que alguns planos estourados demais tenham me irritado um pouco pela excessiva etereidade que acabaram conferindo).

Mas o filme é mesmo de Dominic Cooper, que reina absoluto, seja como o centrado e sofrido Latif, como o excêntrico e psicótico Uday. Até seu eventual 'overacting' cai como uma luva na personalidade de Uday. E Cooper mostra-se bastante competente em diferenciar os dois personagens, mesmo quando eles aparecem idênticos na tela: conseguimos identificá-los por pequenos detalhes, como um olhar ou um mero gestual.

Enfim, pode não ser um filme excepcional, mas talvez valha a conferida pela atuação de Cooper, ou como curiosidade sobre a vida de Uday Hussein, já que, por mais que o ponto de vista da narrativa seja de Latif, o longa acaba sendo sobre o próprio Uday.


por Melissa Lipinski


quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Reféns

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Reféns (Trespass, 2011)

Estreia oficial: 14 de outubro de 2011
Estreia no Brasil: 11 de novembro de 2011

IMDb



Joel Schumacher é dono de uma cinematografia deveras irregular, com longas que vão do excelente ("Um Dia de Fúria", de 1993), passando pelo interessante ("Ninguém É Perfeito", de 1999; "Tigerland", de 2000; ou "Por um Fio", de 2002), até os medíocres ou incrivelmente ruins ("Número 23", de 2007; "O Fantasma da Ópera", de 2004; "O Custo da Coragem", de 2003; "Batman & Robin", de 1997; e "Batman Eternamente", de 1995). E este "Reféns" também entra para este último grupo.

Contando com um roteiro (do estreante Karl Gajdusek) medíocre e sem criatividade, "Reféns" é uma sucessão de erros. A história começa mostrando os três personagens que compõe o núcleo familiar que, como diz o título nacional, serão tomados como reféns. Kyle (Nicolas Cage), Sarah (Nicole Kidman) e Avery (Liana Liberato) formam uma família rica que, apesar da aparente harmonia entre eles, oculta mentiras, segredos e insatisfações.

Mas, na realidade, os personagens pouco importam aqui, já que Gajdusek não faz questão de desenvolvê-los de forma coerente ou minimamente tridimensional. Eles são estereótipos: o rico empresário, frio e calculista, que não tem tempo para a família; a esposa que se sente relegada a segundo plano; e a filha adolescente rebelde mas 'boazinha'.

Quando sua casa é invadida por um grupo de bandidos, entretanto, essas pessoas 'normais' parecem se transformar em verdadeiros estrategistas, entrando em um jogo que, se Gajdusek ou Schumacher tencionaram parecer inteligente e complexo, conseguiram um resultado oposto, caricato e que beira o risível por suas situações forçadas e que desrespeitam a inteligência do espectador.

Os bandidos por si só parecem ter saído diretamente de um filme de comédia. Há o 'psicopata' que só sabe dizer estar apaixonado pela dona da casa (dããã!); a viciada que parece ir direto ao guarda roupa de sua 'anfitriã' para usar suas roupas caras e chiques; o 'fortão-abobalhado' que nem consegue dominar numa luta o franzino refém que ainda está com a mão quebrada (Péra aí! Mas ele não era 'o' fortão!?!?); e o chefe da quadrilha, que se julga tão inteligente que não consegue perceber que está sendo manipulado a todo momento… Enfim, com vilões como esses, como levar o tal 'duelo' de estratégias entre mocinhos e bandidos a sério?

Isso sem falar no trio protagonista! Nicolas Cage mas uma vez apoia-se na suas tão habituais muletas de interpretação para tentar (em vão) dar mais complexidade ao personagem. Nicole Kidman (que ainda bem não está mais sob os efeitos de botox!) limita-se a ficar gritando e/ou chorando o tempo todo, e toda a ação da 'moça' vem seguida ou precedida por incontáveis e irritantes sons lamuriantes. É incrível como esses dois atores conseguem atuações tão contundentes e orgânicas em alguns de seus trabalhos e, em outros, oferecer um trabalho tão pobre e unidimensional... Há ainda a jovem Liana Liberato, que não tem muito o que fazer, já que sua personagem age conforme as necessidades do roteiro: ora choramingando como a mãe, ora enfrentando os bandidos como o pai.

Recheando a trama de revelações e reviravoltas totalmente tolas e desnecessárias, Karl Gajdusek ainda deve ter achado o máximo incluir na sua história vários momentos de 'suspense' (como o envolvimento de Sarah com um dos bandidos ou a real situação econômica de Kyle), e que, auxiliados pelo recurso de flashbacks, deixa tudo ainda mais inverossímel e irritantemente previsível.

E, apesar de alguns pequenos momentos em que Schumacher consegue realmente colocar tensão em suas cenas, a grande parte do filme carece de ritmo (e olha que só tem 90 minutos de duração!), principalmente pelo mal uso dos tais flashbacks. Contando ainda com um final moralista e maniqueísta, "Reféns" vem comprovar que bons filmes são realmente as excessões na cinematografia de Joel Schumacher.


por Melissa Lipinski



terça-feira, 22 de novembro de 2011

A Árvore do Amor

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Árvore do Amor, A (Shan Shu Zhi Lian, 2010)

Estreia oficial: 16 de setembro de 2010
Estreia no Brasil: 21 de outubro de 2011
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Zhang Yimou é um dos mais respeitados cineastas da atualidade, e faz parte da chamada "quinta geração" de diretores da China. Atuando como diretor desde o fim dos anos 1980, é dono de uma vasta cinematografia que inclui, predominantemente, melodramas que têm como pano de fundo a realidade econômica e política de seu país em diferentes épocas.

Ainda que tenha flertado com as artes marciais (ou wuxia pian como o gênero é conhecido) em uma belíssima trilogia ("Herói", de 2002; "O Clã das Adagas Voadoras", de 2004; e "A Maldição da Flor Dourada", de 2006), a maioria dos seus filmes realmente tem o melodrama como estilo. E este "A Árvore do Amor" não foge à regra, e revela-se não só um belíssimo drama, como um excelente filme sobre a natureza do amor, além é claro de situar-se em um importante período político da China.

O roteiro (baseado em um romance de Ai Mi), passa-se durante a Revolução Cultural (década de 1960), e acompanha a estudante Jing (Zhou Dongyu) que é mandada para o campo para aprender novos valores (pois somente com os camponeses, os jovens poderiam se ver livres dos preceitos capitalistas e aprenderem a ser comunistas 'de verdade'). Lá, a jovem acaba conhecendo Sun (Dou Shawn) e se apaixonando. Porém ambos vêm de famílias com históricos políticos bem diferentes. Ele é filho de um importante membro do Partido Comunista; já ela precisa se desdobrar para recuperar a honra de sua família, pois seu pai é um preso político por ser 'de direita'. Porém, não será fácil 'manter-se na linha' à medida que a paixão entre os dois aumenta, já que Sun sempre está por perto, não apenas para namorá-la, mas para ajudá-la em muitos aspectos (no trabalho, financeiramente…). Porém, para uma jovem 'direita', ser vista com um rapaz não era adequado, o que pode prejudicar Jing em seu intuito de recuperar o nome de sua família.

A grande 'sacada' de Yimou é a maneira como ele constrói o romance entre os dois jovens, através de pequenas sutilezas, como um tocar de mãos ou o 'empréstimo' de um casaco. São esses detalhes que fazem o relacionamento (jamais declarado) entre eles soar tão autêntico e sensível ao mesmo tempo. Ficamos torcendo para que eles consigam vencer as barreiras impostas pela sociedade para que terminem juntos, porque acreditamos na sinceridade daquele sentimento. É realmente muito bonito.

O cineasta ainda confere um tom literário ao seu romance, incluindo, de tempos em tempos, cartelas que não só denotam a passagem de tempo, mas que também trazem escritas ações, e principalmente, sentimentos dos protagonistas. Tal recurso funciona muito bem tanto para as elipses temporais, como para dar um tom mais épico à narrativa.

Apostando sua força na atuação de seus jovens protagonistas, o cineasta chinês não erra, já que os dois jovens atores fazem composições bastante verdadeiras de seus personagens. Ancorados sobretudo na ingenuidade, o relacionamento entre os dois tem sua força na química que se estabelece entre o casal. Zhou Dongyu e Dou Shawn transmitem tamanha naturalidade que um simples e longo plano fechado em seus rostos durante um encontro num lago, transmite toda a ansiedade e força que a proximidade entre eles causa em ambos. E não é preciso nenhum contato físico entre eles para que se estabeleça toda a tensão e o desejo que sentem um pelo outro.

Enfim, como falei, o filme é um melodrama, e como tal, emprega sua força na dor e nos obstáculos para a felicidade de seus protagonistas. E Zhang Yimou é mestre em conduzir esse tipo de história sem transformá-la em um drama meloso e aborrecido. Provando que o cineasta chinês ainda mostra a mesma sensibilidade e competência que o transformou em um dos maiores cineastas da atualidade.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A Casa dos Sonhos

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Casa dos Sonhos, A (Dream House, 2011)

Estreia oficial: 30 de setembro de 2011
Estreia no Brasil: 4 de novembro de 2011
IMDb



Se você assisitiu ao trailer de "A Casa dos Sonhos" poupe-se ao trabalho de ver o filme, já que o trailer entrega toda e qualquer 'surpresa' que o longa poderia ter, e conta absolutamente a história inteira. Assim, o trailer acaba revelando-se bem melhor do que o próprio filme, já que nele não há a grande quantidade de diálogos absurdos, os personagens não se revelam caricaturais e inverossímeis, e as situações não beiram ao ridículo.

Bom, mas falando do filme, o roteiro de David Loucka (cujo próprio sobrenome prenuncia a 'qualidade' do roteiro... Sorry, não resisti!), abusa de situações 'clichês' e que, de tão irreais, chegam à beira do risível. Will Atenton (Daniel Craig) é um editor de livros que se afasta do trabalho para passar mais tempo com a família e para escrever um tão sonhado livro. Quando o filme tem início, ele, sua esposa Libby (Rachel Weisz) e suas duas filhinhas acabaram de se mudar para uma casa em uma pequena cidade. Porém, coisas estranhas começam a acontecer nesta casa, e ele descobre que, cinco anos antes, o homem que ali morava matou sua família (esposa e duas filhas). Contando com a ajuda de uma vizinha (Naomi Watts), Will acaba descobrindo que ele mesmo é o dito assassino, seu verdadeiro nome é Peter Ward, e que sua família não passa de alucinações; apesar de ele afirmar que não foi o responsável pelas mortes (bom, até aqui não cometi nenhum spoiler, pois como disse, o trailer entrega tudo isso!).

Há boatos que Jim Sheridan tentou de tudo para que seu nome fosse tirado do filme, pois não teria gostado do resultado final, e que o estúdio produtor reeditou o filme a seu modo. Mas a verdade é que, desde o início (já no roteiro), a história tem problemas. Problemas na base de sua ideia (a tal 'chocante' revelação), no desenvolvimento de seus personagens, nos seus diálogos embaraçosos, nos seus vilões absurdos, nas situações que dão raiva de tão inverossímeis... a lista é longa! Por que, por exemplo, ninguém se revolta, ou nem sequer diz uma palavra a Will quando ele sai pela cidade fazendo perguntas sobre o assassino? Todos o conhecem e sabem que ele é o principal suspeito. Será mesmo que numa cidadezinha, ninguém iria enfrentá-lo quando ele saísse pelas ruas 'se fazendo de desentendido'? Ele chega a questionar policiais, que, simplesmente, o olham com uma cara feia e de desconfiança deixando tudo 'por isso mesmo'. Eu não acredito! Ou o papel da vizinha (Watts) em toda a história e a subtrama que envolve seu desentendimento com o marido que, além de comprometer o ritmo do longa, revela-se tão patética quanto a motivação dos verdadeiros vilões, que são revelados já no fim do filme. Seria até engraçado, se não fosse vexatório.

O pior de tudo é que, no desenvolver da história, conseguimos ver a 'mão' de Jim Sheridan ali, já que, quando foca-se no desenvolvimento da família de Will e em seus laços e dinâmica familiares, o diretor consegue imprimir uma verdade, uma certa profundidade em seus personagens (que, infelizmente, não é levada a diante), e nós, espectadores, realmente chegamos a nos importar com aquelas pessoas, Will, Libby e suas meninas, as pequeninas e encantadoras Trish e Dee Dee (Taylor e Claire Geare, que são também irmãs na vida real). Porém, essa identificação dura pouco, já que o roteiro 'volta' a se fazer presente a todo momento.

E o bom elenco até tenta - em vão, obviamente - dar mais complexidade a seus personagens. É de dar pena as caras que Daniel Craig faz para tentar diferenciar seus dois 'eus'. Ou o ar sempre assustado de Libby (Weisz) ou sempre em pânico de Ann (Watts). Enfim, quando a matéria prima é ruim, nem um Marlon Brando ou Jack Lemmon consegue salvar por completo o resultado final!

E por mais que, tecnicamente, o filme seja muito competente - em especial a fotografia de Caleb Deschanel, que consegue, elegantemente, diferenciar o mundo real do protagonista e seu universo alucinatório - não é o suficiente para apagar ou mascarar um roteiro tão fraco.

Mas o mais revoltante é ver o nome de Jim Sheridan nessa porc.., digo, filme. Responsável por trabalhos memoráveis, complexos e sensíveis como "Meu Pé Esquerdo" (1989), "Em Nome do Pai" (1993), "O Lutador" (1997), "Terra de Sonhos" (2002) e "Entre Irmãos" (2009); é inconcebível a escolha do cineasta por um trabalho tão medíocre como esse.

Mas enfim, revoltas à parte, como falei lá no primeiro parágrafo, a verdade é que esse "A Casa dos Sonhos" funciona bem melhor como trailer do que filme.


por Melissa Lipinski


sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Hora Menos

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Hora Menos (2011)

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Duas mulheres completamente distintas unidas por uma tragédia e que, juntas, tentam recomeçar suas vidas. Essa é a premissa deste "Hora Menos", estreia na direção de longas do ator Frank Spano.

Isabel (Rosana Pastor) é espanhola, mas trabalha como enfermeira na Venezuela auxiliando seu marido médico. Yudeixi (Erika de Santiago) é uma menor infratora. Depois que um maremoto arrasa com a cidade onde elas moravam, matando a única família que possuíam, elas se vêem refugiadas nas Ilhas Canárias (território espanhol), e criam um vínculo de amizade e companheirismo para poderem seguir com suas vidas.

Pena que o roteiro, do próprio Spano, não consegue se sustentar durante toda a duração do longa, já que sua premissa até soava interessante. Porém, a falta de argumentos transforma seu segundo ato em uma miscelânea de enrolações, com uma subtrama desnecessária sobre imigrantes ilegais que são trazidos para trabalhar de maneira escrava; e a introdução de um personagem igualmente redundante - o do menino autista que Isabel acaba assumindo.

Porém, quando volta-se para os dramas individuais das duas protagonistas, e suas dificuldades em recomeçarem do zero, a história ganha em força e dramaticidade. Também é auxiliado pela excelente atuação de Rosana Pastor e Erika de Santiago, que conseguem transmitir o sofrimento passado pelas suas personagens em pequenos gestos, como um simples olhar.

Porém, o ritmo do longa, que começa bem, é prejudicado pela perda de foco narrativo e pela divisão da história em 'atos' ou 'partes', que nada contribuem para o entendimento da trama.

Sem possuir arroubos criativos ou deleites visuais, "Hora Menos" é um filme apenas correto, e que ganha força pela qualidade de suas protagonistas.


por Melissa Lipinski


OBS: Comentário escrito durante a 35ª Mostra Intrnacional de Cinema de São Paulo.


quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Labrador

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Labrador (Labrador, 2011)

Estreia oficial: 30 de abril de 2011
Estreia no Brasil: sem data prevista

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"Labrador" é um tanto quanto perturbador. Possui apenas três personagens (e mais um cachorro) e a história se passa em um cenário totalmente desolador: uma ilha deserta e fria, que diz muito sobre a personalidade ou estado de espírito dos próprios personagens.

Sem uma história muito complicada, o roteirista Daniel Dencik e a diretora Frederikke Aspöck conseguem focar no que mais interessa aqui: seus protagonistas. Pois este é um filme de personagem, já que se baseia inteiramente nas relações que estes três indivíduos travam nesta desértica ilha.

Mas vamos dar 'nomes aos bois'. A história começa com Stella (Stephanie Leon) e seu namorado, Oskar (Carsten Bjørnlund) chegando na tal ilha para visitarem o pai da moça, Nathan (Jakob Eklund), um artista plástico que resolveu isolar-se do mundo tendo como única companhia, uma cadela da raça labrador. Porém, logo de cara, Nathan antipatiza com Oskar, e Stella vê-se em meio a um confronto de palavras e olhares, dos quais ela mesma toma parte. Porém, a visita aparentemente simples e desinteressada (ou nem tanto), acaba se tornando um verdadeiro desastre quando antigos segredos são revelados (e não vem ao caso mencioná-los para não estragar a surpresa).

Muito bem intepretada por seus atores, a história peca por ser toda calcada sobre esse segredo. Porém, ele acaba por revelar-se fraco e inconsistente, pois é impossível pensar que Stella nunca tenha feito uma matemática básica quando criança, e suspeitado que algo na sua base familiar não estava certo. Assim, se a base é fraca, toda a estrutura da narrativa também parece falhar. E o faz intermitentemente.

Porém, apesar da premissa um pouco forçada, o drama psicológico que se estabelece entre os protagonistas é intenso, e aborda conflitos familiares e relações humanas de uma forma complexa e até mesmo doentia.

Mas é mesmo a escolha da locação que faz tudo soar ainda mais complicado. A impressionante melancolia e isolamento do local reflete no comportamento do trio protagonista, que vê sua aparente harmonia desmoronando-se à medida que a história avança.

Talvez o desfecho seja apressado demais, mas nada que desmereça o trabalho como um todo. Pena que o grande tropeço tenha acontecido lá no início, na 'ideia-base' de toda a trama, e isso não há como desconsiderar…


por Melissa Lipinski



OBS: Comentário escrito durante a 35ª Mostra Intrnacional de Cinema de São Paulo.


segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Os 3

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

3, Os (2011)

Estreia oficial | no Brasil: 11 de novembro de 2011
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"Os 3", longa dirigido por Nando Olival (diretor do 'hit' da internet, "Eduardo e Mônica", e que co-dirigiu - com Fernando Meirelles - "Domésticas - O Filme", de 2001) aposta em uma linguagem dinâmica para abordar o universo jovem, ainda falando sobre sexualidade e consumismo. Porém, se tecnicamente, o filme acerta em quase tudo, o mesmo não se pode dizer em termos de conteúdo.

O roteiro, escrito pelo próprio Olival e por Thiago Dottori, mostra como três universitários - Rafael (Victor Mendes), Camila (Juliana Schalch) e Cazé (Gabriel Godoy) - se conhecem, vão morar juntos, convivem durante os quatro anos da faculdade e embarcam numa experiência de reality show em seu próprio apartamento.

Um dos principais méritos do filme é sua edição, que dá dinamismo à história, fazendo-a fluir no ritmo certo, e com elipses temporais bem realizadas que dão conta do seu objetivo de forma elegante. A fotografia e a direção de arte também acertam.

Porém, o mesmo não se pode dizer de seus personagens e os drama pelos quais eles passam. Interpretados de forma irregular por seus protagonistas (que alternam momentos de delicada sinceridade com outros de dolorosa canastrice), os personagens vistos em "Os 3" soam superficiais e estereotipados demais. Faltou sutileza em suas composições para que o longa conseguisse alcançar um outro patamar. Não que a história seja ruim. Até porque a interação e a química entre os protagonistas é boa. Mas faltou um 'algo mais'.

Mas o grande problema são as motivações e dúvidas pelas quais os três amigos passam, que nunca soam realmente convincentes ou verdadeiras. Parecem apenas dramas colocados à frente deles para que o roteiro possa evoluir, não soam 'reais'. Assim como suas ações, que, em determinado ponto da história, até se tornam óbvias e previsíveis.

O filme conta com uma estrutura circular interessante, que pode parecer ter um começo meio forçado, mas que o desenrolar da história trata de contextualizá-lo e fazê-lo, em retrospectiva, soar melhor do que se havia imaginado, o que não deixa de ser um grande ponto positivo para Nando Olival.

Porém, nem todo o filme se encaixa nessa lógica e, ao final, a impressão que fica é a de um filme 'bacaninha', mas que faltou se aprofundar nas questões levantadas, e que resultou tão esquemático quanto seus personagens. O que é uma pena, pois havia um grande potencial aí.


por Melissa Lipinski


sábado, 12 de novembro de 2011

Dez Invernos

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Dez Invernos (Dieci Inverni, 2009)

Estreia oficial: 10 de dezembro de 2009
Estreia no Brasil: sem data prevista
IMDb



Essa história de amor que se passa na charmosa Veneza durante - como diz o título - dez invernos, abusa da paciência do espectador, pois além de deveras previsível, conta com personagens mal construídos e sem carisma algum.

Ao se conhecerem por acaso numa balsa, Camilla (Isabela Ragonese), recém chegada de sua cidadezinha para estudar literatura russa em Veneza; e Sylvestre (Michele Riondino), que está perdido na vida, vão tecendo um relacionamento que inicia apenas por encontros ao acaso, torna-se uma amizade à distância, para depois se transformar em um forte sentimento de amizade que, naturalmente, evolui para um amor desencontrado, já que ambos, hora ou outra, envolvem-se com outras pessoas.

Já no início, quando somos apresentados aos dois personagens, as situações soam forçadas demais, inverossímeis, o que dificulta acreditarmos no interesse que surge entre eles. E, à medida que a narrativa avança, não só Camilla e Sylvestre não são melhores construídos, como há a inclusão de novos personagens que aparecem ou desaparecem, e envolvem-se com os protagonistas de forma abrupta e mal explicada.

Abrupta também são as elipses temporais. Como a história acontece apenas em invernos, a passagem de tempo sempre parece entrecortada, e prejudica o ritmo do longa. Como as elipses são longas demais, as transformações que os personagens sofrem durante elas são muitas, o que também dificulta o entendimento de suas ações, já que algumas, até contradizem o que havia sido mostrado até então.

Com uma fotografia que não consegue explorar devidamente as belas locações onde a história acontece (principalmente Veneza e Moscou), "Dez Invernos" acaba soando burocrático e esquemático demais. Sem inovar ou deleitar os olhos do espectador.

O diretor estreante, Valerio Mieli (que também divide a autoria do roteiro com Davide Lantieri e Isabella Aguilar), também não consegue uma boa atuação de seu elenco, o que também acaba prejudicando o andamento da narrativa, e fazendo-a soar um tanto quanto piegas até.

Enfim, "Dez Invernos" é aquele filme regular. Não chega a ser um embaraço, mas seus defeitos conseguem sobrepor-se às suas qualidades, e isso nunca é bom.


por Melissa Lipinski


OBS: Comentário escrito durante a 35ª Mostra Intrnacional de Cinema de São Paulo.


sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Veneza

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Veneza (Wenecja, 2010)

Estreia oficial: 11 de junho de 2010
Estreia no Brasil: ainda sem data prevista
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"Veneza", do polonês Jan Jakub Kolski, é uma fábula infanto-juvenil densa, que tem como pano de fundo a Polônia invadida pelos alemães durante a Segunda Guerra Mundial.

O roteiro, do próprio Kolski, conta a história de Marek (Marcin Walewski), um menino de 11 anos cujo maior sonho é conhecer, como diz o título, Veneza. Estudando em um colégio interno, e com pais mais interessados nos privilégios que seu alto poder econômico lhes proporciona do que nos próprios filhos (Marek tem um irmão mais velho, Wiktor, interpretado por Filip Piotrowicz), Marek se vê ainda mais longe do seu sonho quando a guerra se intensifica, e sua família abriga-se em sua grande casa no interior do país, que sua tia Weronika (Grazyna Blecka-Kolska) toma conta.

É para esta grande residência que dirigem-se outras duas irmãs de sua mãe, algumas primas e sua avó; além do caseiro, seu filho (ambos judeus) e uma moça que ajuda a cuidar da casa. Entre idas e vindas dos familiares (que constantemente saem para a guerra ou para a cidade), o porão da casa inunda, e Marek cria sua própria versão da tão sonhada cidade italiana. Para poupar as crianças da dura realidade que toma conta do país (sempre há soldados alemães nas redondezas), as tias do garoto também embarcam em sua fantasia.

Kolski (assim como Guillermo del Toro fazia em "O Labirinto do Fauno", de 2006) investe em um mundo fantástico criado por uma criança para fugir da bruta realidade que a guerra lhe impõe. E, assim como no filme de del Toro, a sensibilidade, pureza e inocência das crianças são combinadas com momentos da mais cruel brutalidade que uma guerra pode afligir. Além disso, o diretor ainda encontra espaço para questionar e abordar outros temas relevantes que servem de fundo para a história principal, como o preconceito contra os judeus, problemas familiares, amor materno e a transição da infância para a adolescência.

Com uma imensa sensibilidade, Kolski e o fotógrafo Arthur Reinhart criam planos belíssimos, com movimentos de câmera elegantes e até mesmo inusitados. Ajudados ainda pelas belíssimas locações, criam uma ambientação que reitera ainda mais o tom fabulesco do longa.

Apesar do início um pouco confuso (quando a grande quantidade de personagens entra em cena), o diretor vai dando o tempo necessário para que todos se desenvolvam, ainda que em maior ou menor escala. Porém o grande número de subtramas acaba fazendo com que o ritmo do filme resulte um pouco irregular, e sem tempo para se aprofundar devidamente em cada uma delas.

Porém, a trama central guiada por Marek costura todas as demais. E, ao final, é a história deste pequeno sonhador que fica gravada na memória. Uma história linda e melancólica, que emociona pela sua fantasia idealizadora de felicidade e sua dura realidade de tristezas.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


OBS: Comentário escrito durante a 35ª Mostra Intrnacional de Cinema de São Paulo.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Hiroshima: Um Musical Silencioso

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Hiroshima: Um Musical Silencioso (Hiroshima, 2009)

Estreia oficial: 12 de novembro de 2009
Estreia no Brasil: 07 de outubro de 2011
IMDb



Pablo Stoll já escreveu e dirigiu três longas-metragem. Dois deles, "25 Watts" (2001) e "Whisky" (2004), em parceria com Juan Pablo Rebella (que morreu aos 32 anos em 2006, quando cometeu suicídio). E parece que era justamente essa parceria que dava certo, já que os filmes resultantes dela eram realmente bons; porém esse "Hiroshima: Um Musical Silencioso" decepciona.

Realizado como um filme caseiro, "Hiroshima" tem como protagonistas os parentes próximos de Stoll (nem os nomes não foram mudados). A trama acompanha Juan Andrés Stoll em um cotidiano entediante. Não há muito o que falar, a história simplesmente segue os passos do protagonista no que seria um dia qualquer de sua ordinária vida.

Chama a atenção (mesmo sem uma justificativa aparente), a escolha em expressar os diálogos por meio de cartelas (como um filme mudo), ainda que os sons ambientes e a trilha musical estejam presentes. É fato que os diálogos são altamente descartáveis nesta história, inclusive as próprias cartelas que, além do experimentalismo, não se justificam.

A trama é quase que um 'road-movie' dentro de Montevidéu, porém soa episódica demais, sem mostrar nenhuma correlação entre os fatos. Assim, pessoas e acontecimentos passam pela vida de Juan sem nunca parecer afetá-lo ou despertar qualquer sentimento no rapaz, que está sempre impassível a tudo e a todos.

Não sei, talvez eu é que não tenha conseguido "entrar" no clima do filme. E, apesar de algumas cenas interessantes como o embate entre pai e filho que lembra um western; ou a sequência em que Juan e a namorada lancham em frente a um hospital enquanto os figurantes realizam suas ações repetidamente atrás deles; de modo geral o filme me pareceu tão sem sentido quanto seu protagonista. Um projeto tão pessoal de Stoll que parece não se conectar com as demais pessoas (assim como seu personagem). Bom, talvez o filme seja mesmo o reflexo de uma experiência traumática na vida do cineasta, depois do suicídio de seu parceiro de trabalho e amigo.

Mas o fato é que resultou pessoal demais. E impessoal demais.


por Melissa Lipinski


quarta-feira, 9 de novembro de 2011

A Pele que Habito

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Pele que Habito, A (La Piel que Habito, 2011)

Estreia oficial: 17 de agosto de 2011
Estreia no Brasil: 4 de novebro de 2011
IMDb



Pedro Almodóvar é um cineasta obcecado pelo universo feminino. Mesmo tendo produzido filmes tão diferentes entre si como "Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos" (1988), "Ata-Me!" (1990), "Kika" (1993), "A Flor do Meu Segredo" (1995), "Carne Trêmula" (1997), "Tudo Sobre Minha Mãe" (1999), "Fale com Ela" (2002), "Má Educação" (2004), "Volver" (2006) e "Abraços Partidos" (2009), há sempre um tema que envolve feminilidade nestas produções. Em "A Pele que Habito", obviamente, não poderia ser diferente. E, se em "Tudo Sobre a Minha Mãe", "Fale com Ela" e "Má Educação", o cineasta já abordava o lado feminino existente em todo homem, aqui Almodóvar vai ainda mais longe, e literalmente transforma um homem em mulher (sim, spoiler!).

Porém, se o assunto é recorrente, a forma como o cineasta o aborda é algo novo em sua cinematografia. A partir do livro "Tarantula", de Thierry Jonquet, Almodóvar escreveu um roteiro repleto de suspense, tensão e violência. Porém, não uma violência física escrachada na tela; mas uma violência contida, presente em toda a ambientação das cenas, expressa na construção dos planos, desde os menores objetos (como uma navalha, por exemplo, que aparentemente serve apenas para barbear) até as frases enigmáticas ditas por seus personagens. É um terror psicológico, criado não em cima de sustos, mas a partir de um mal estar; pintado com características 'almodovarianas' que tão bem conhecemos, com doses de absurdos e exageros.

Porém, se o tom do filme sugere um longa típico de Almodóvar, o mesmo não se pode dizer de sua estética. Preferindo cores mais frias às habituais cores fortes e quentes que utiliza, "A Pele que Habito" ainda conta com uma direção de arte impecável que, aliada à bela fotografia de José Luis Alcaine, ajudam a construir a sensação de incômodo transmitida pela história.

Conseguindo manter o ritmo (e a tensão) do início ao fim, Almodóvar acerta ao contar sua história de forma não cronológica, desvendando aos poucos a origem de cada personagem, cada ação, e cada ligação entre eles. E as elegantes 'rimas' visuais que o cineasta cria - por exemplo ao vermos Vicente (Jan Cormet) vestindo um manequim da mesma forma que fará posteriormente com Norma (Blanca Suárez); ou o jeito como o mesmo Vicente costura retalhos em um busto, que será idêntico ao que outra personagem costurará seus próprios retalhos - enriquecem ainda mais a sua obra, além de dar pistas ao espectador do que está por vir.

Há ainda o grande elenco, que conta com belíssimas atuações (e composições de personagens) de Antonio Banderas, que domina o filme de forma madura e centrada (apesar de seu personagem não apresentar esta característica); da bela Elena Anaya, com uma aparente fragilidade que esconde seu verdadeiro 'eu'; e ainda de Jan Cornet, Blanca Suárez e Marisa Paredes (antiga colaboradora de Almodóvar), que acabam se destacando nos auges dramáticos de seus respectivos personagens.

Enfim, "A Pele que Habito" transita entre o horrível e o belíssimo. Aliás, transformar atos horrendos em momentos de extrema sensibilidade, sem deixar de causar estranhamento ou incômodo, é algo que só Pedro Almodóvar poderia fazer. E fez.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


terça-feira, 8 de novembro de 2011

O Palhaço

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Palhaço, O (2011)

Estreia oficial | no Brasil: 28 de outubro de 2011
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Depois de assistir a este "O Palhaço", constato que Selton Mello não é mais um bom ator…

Neste seu segundo longa como diretor (em ambos divide a coautoria do roteiro com Marcelo Vindicato), Mello cria uma espécie de road movie melancólico e doce ao mesmo tempo, habitado por personagens fascinantes.

Acompanhando as viagens do pequeno circo Esperança, o roteiro apresenta, logo de cara, os integrantes da trupe, encabeçada pelos palhaços Puro Sangue (Paulo José) e Pangaré (Selton Mello) durante um espetáculo que já prenuncia o tom de toda narrativa: apesar de se tratar de um circo, e provocar o riso nos espectadores (tanto os do circo, como os do filme), há um certo ar de tristeza que envolve todo aquele show. E Selton Mello já acerta desde o início em mostrar os poucos artistas se desdobrando em funções também nos bastidores enquanto os números acontecem. E, ao focar as reações destes integrantes, o diretor já estabelece, desde a primeira cena, a proximidade entre eles e o espectador.

Esses planos centrados nos personagens mostram o quanto o diretor/roteirista preza por eles e pelo seu ofício. Mas não só os artistas do circo merecem tal carinho, já que quase todos os personagens que cruzam o caminho destes protagonistas aparecem (por vezes) voltados para a câmera, como que falassem diretamente com o público - e isso acontece com os gêmeos mecânicos interpretados por Tonico Pereira; o funcionário que faz carteiras de identidade feito por Ferrugem; o delegado de Moacyr Franco; entre outros. Aliás, ao resgatar personalidades como Moacyr Franco, Jorge Loredo e Ferrugem, Selton Mello demonstra um imenso respeito e admiração pela cultura e comédia nacional.

Mas o mais tocante do filme de Mello é notar com que delicadeza o diretor trabalha os bastidores do pequeno circo e a dúvida que se abate sobre seu líder, Benjamin (ou Pangaré), belamente retratada no paralelo que se cria com um ventilador.

E o grande mérito do longa é contar com atuações não só competentes, mas marcantes. Não apenas as de atores consagrados, mas de todos do elenco que, em algum momento ou outro, ganham tanta importância quanto o protagonista Benjamin. Mas certamente Selton Mello compõe seu personagem com graça e tristeza em iguais medidas. E claro, há sempre a presença marcante de Paulo José, que apenas em um olhar consegue expressar muita coisa (e a cena do espetáculo final é a prova indelével disto).

Contando ainda com uma belíssima fotografia, e uma direção de arte impecável (capaz de criar ambientes tão expressivos quanto os personagens que neles habitam), Mello e a montadora Marilia Moraes conseguem imprimir um ótimo ritmo ao longa, que tem seu ápice no espetáculo circense final - que embora semelhante em quase tudo ao espetáculo de abertura do filme, tem um tom totalmente diferente ao retratar o estado de espírito tanto de Benjamin quanto o da verdadeira 'dona' da história, a garotinha Guilhermina (Larissa Manoela).

Enfim, como ia dizendo lá no primeiro parágrafo, Selton Mello não é mais apenas um bom ator. Depois de dois longas totalmente distintos entre si, ele também já deixou de ser um diretor promissor e se firmou como um ótimo cineasta.

Com o perdão do trocadilho, esse filme é um espetáculo! Fica a dica!


por Melissa Lipinski


segunda-feira, 7 de novembro de 2011

180º

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

180º (2011)

Estreia oficial | no Brasil: 16 de setembro de 2011
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"180º" é o longa de estreia tanto de Eduardo Vaisman como diretor, como de Cláudia Mattos como roteirista. E ambos saem-se muito bem nesta trama que envolve um triângulo amoroso e a autoria de um livro.

Falar mais sobre o roteiro seria estragar o grande mérito do filme: sua não linearidade. A ótima edição recortada de Ana Teixeira, que vai e volta na história em diferentes tempos é o que transforma esta história relativamente simples em um intrincado quebra-cabeças que tem o tom certo de tensão e intrigas, além de ditar o ótimo ritmo do longa. A grande sacada da produção é ir revelando os fatos aos poucos, para que o espectador vá montando, por si só, a sequência correta da trama.

Não que isso seja uma novidade, afinal o excepcional "Amnésia" (2000), de Christopher Nolan, já utilizava desta narrativa entrecortada e fora de ordem, também fazendo com que uma história simples (até banal) transformasse-se em um intrincado thriller.

Porém, a história de Mattos e Vaisman não tem o mesmo brilho do filme de Nolan, justamente por pecar em seu ato final. Depois de montado o quebra-cabeças por parte do espectador, o desenlace desta bem construída história soa não só fraco, como simplista demais. Como se a autora não soubesse como finalizar o que construi até então.

Outro problema que enfraquece a narrativa é a trilha musical óbvia e redundante, que acaba prenunciando que algum fato importante virá a acontecer.

Mas o bom trabalho do elenco supera essas derrapadas. O grande destaque fica por conta de Malu Galli que transita bem entre a meiguice e a mau caratice. Eduardo Moscovis também está bem. Sendo Felipe Abib o ponto mais fraco deste triângulo, porém sem constrangimentos.

Pena o final, que realmente enfraquece a trama. Mas todo seu desenvolvimento até ali, juntamente com a bonita fotografia e o elenco afinado garantem um filme que vale a pena conferir.


por Melissa Lipinski


domingo, 6 de novembro de 2011

Natimorto

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Natimorto (2009)

Estreia oficial | no Brasil: 29 de abril de 2011
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"Natimorto" é a segunda adaptação de um romance do escritor e autor de histórias em quadrinhos, Lourenço Mutarelli, e guarda interessantes similaridades com a obra anterior, "O Cheiro do Ralo" (de 2006). Ambas tratam de um romance obsessivo, tendo como objeto de adoração uma mulher que ao mesmo tempo aparenta estar tão perto, mas é propositadamente inatingível ao protagonista.

E é o próprio Mutarelli quem protagoniza esta bizarra história cujos personagens não têm nome. Ele interpreta uma espécie de produtor musical que recebe uma cantora (Simone Spoladore) que, supostamente, teria a mais bela das vozes. Encantado com a garota e desgostoso com o mundo ao seu redor, o homem propõe a ela que eles vivam fechados em um quarto de hotel, pois suas economias lhes garantiriam morar ali por uns 6 anos. Depois de certa relutância da cantora, eles acabam entrando em um acordo, onde ele permaneceria ali enclausurado, e ela poderia sair - até para poder trabalhar e bancar parte das despesas. A partir deste confinamento (total dele e parcial dela), ambos vão adentrando e intensificando uma relação de dependência, onde ele conta suas histórias de vida, e ela, em troca, canta para ele, enquanto impregnam-se de cigarros. Dependência tanto um do outro (mais da parte dele do que dela, obviamente), como do cigarro. Ele, inclusive, tem a rotina de 'ler' a sua sorte nas imagens de advertência impressas no verso dos maços, fazendo um paralelo com as cartas de tarô, o que vai consumindo-o e deprimindo-o cada vez mais.

O roteiro de André Pinho concentra-se quase que inteiramente no interior do tal quarto de hotel (apenas a introdução dos personagens e os flashbacks nos quais aparece a esposa do agente - Betty Gofman - passam-se fora dali). E por isso mesmo, o filme baseia-se todo sobre as atuações de seus protagonistas. Simone Spoladore (ótima como sempre) empresta doçura e cinismo na medida certa para sua personagem. Mas é Mutarelli tanto o ponto alto quanto o mais baixo da produção. No início, sua interpretação mais teatral soa um pouco artificial, e o coloca em desigualdade com sua companheira de cena. Porém, à medida em que o filme avança, essa mesma teatralidade recai como uma luva sobre a paranóia do personagem, elevando a qualidade de sua interpretação.

Contando com uma fotografia excepcional de Lito Mendes da Rocha, que mantém planos em movimento, ora fechados nos rostos dos atores, em desfoque, ora mais abertos, mostrando as luzes coloridas que vêm da rua e entram pela janela do quarto, praticamente 'pintando' os quadros; toda a ambientação vai armando uma crescente sensação de sufocamento e claustrofobia. Aliado a isso, o diretor Paulo Machline mantém o bom ritmo do filme inserindo os flashbacks em ordem não cronológica em meio à narrativa.

Assim como a loucura do seu protagonista, a sensação de desconforto criada no espectador vai aumentando ao longo do filme. Fica, ao final, um sentimento amargo: será mesmo que a humanidade é tão cruel a ponto de se preferir a misantropia? Como diz o personagem em certa altura do filme ao invejar um natimorto: "imagine ir da não-existência à não-existência, protegido pelo único ser que vai te amar, ficando afastado dos males do mundo". E a ótima opção em não mostrar a voz de Simone Spoladore cantando reitera esse aspecto, afinal, nós, espectadores, fazemos parte do 'mal do mundo', e não seríamos merecedores de ouvir a mais bela das vozes.

Enfim, "Natimorto" é assim, doentio e sufocante. Como seu protagonista.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski